Em outubro de 2017, a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC) entregou à sociedade o resultado final das Rotas Estratégicas Setoriais, um programa âncora do Observatório da Indústria, que traçou o futuro esperado para importantes setores econômicos no Ceará. Depois disso, uma nova problemática ganhou repercussão no setor produtivo, provocando o estímulo à criação de mais uma rota, considerada fundamental para o desenvolvimento do estado: a segurança pública.
Apesar de toda a sinergia e visão sistêmica nas entregas feitas até aquele momento, essa temática ainda não havia recebido a contribuição da Federação, apesar de gerar efeitos determinantes. “Imagine que nossas indústrias de panificação estavam tendo dificuldades para oferecer o tradicional pãozinho logo cedo, porque os padeiros não conseguiam sair de casa antes de o sol raiar por conta da insegurança”, exemplifica o líder do Observatório da Indústria, Sampaio Filho.
Os impactos da insegurança para a sociedade vão além de qualquer mensuração. Em tentativa de dimensionar tais impactos, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta o tamanho do prejuízo gerado que representa 5,5% do PIB Brasileiro. A problemática atinge a população e os trabalhadores da indústria, reduzindo a produtividade do país, além de gerar perdas ao setor produtivo, seja por furtos e roubos nas unidades fabris ou cargas transportadas, bem como na elevação dos custos de frete, seguros e segurança privada.
“Diante desse cenário, o custo de possíveis equívocos nas ações de controle da criminalidade é cada vez maior, elevando a importância do planejamento, da ação sinérgica, da adaptação das melhores práticas mundiais para esolução desses problemas”, lembra o presidente da FIEC, Beto Studart, para quem um ambiente de paz favorece a competitividade e produtividade das empresas.
A proposta foi levada ao governador Camilo Santana, que enalteceu a iniciativa, garantindo o envolvimento de sua equipe de secretários. De lá para cá, representantes do meio acadêmico, governo, terceiro setor e setor produtivo se reuniram para discutir uma visão de futuro para a segurança pública do estado no horizonte de 2025. “A Rota Estratégica da Segurança Pública é um exemplo muito valioso da lógica e do espírito que o Pacto por um Ceará Pacífico pretende induzir. O pacto estimula essa participação, esse envolvimento e corresponsabilidade para o enfrentamento da violência, aumentando as chances de enfrentamento com alguma perspectiva de sucesso”, frisou a vice-governadora do estado do Ceará Izolda Cela.
Ao todo, mais de 45 especialistas participaram dos encontros, garantindo a validade do documento final que é composto de uma visão de futuro, cinco dimensões de análises, 392 ações de curto, médio e longo prazo, bem como um conjunto de vetores de transformação identificados nas discussões. “Fizemos uma ampla consulta a documentos nacionais e internacionais para balizar o diagnóstico do panorama atual do Ceará. O levantamento foi levado ao painel de especialistas, e eles fizeram a priorização das ações”, esclarece a pesquisadora do Observatório da Indústria, Mariana Biermann.
O resultado das discussões foi compilado em um relatório, entregue à sociedade no último mês de outubro. De acordo com a publicação, em 2025 o Ceará pretende ser “seguro, reconhecido pela promoção da cultura de paz, garantia de direitos e inovação nas ações integradas de prevenção e controle da violência”. Para alcançar esse patamar, foram identificadas cinco dimensões de análise, que auxiliam na categorização e organização das ações: Segurança e Defesa social, Prevenção, Governança, Sistema Prisional e Sistema Socioeducativo.
PANORAMA ATUAL
A participação do Ceará no total de homicídios em 2016 foi o equivalente a 5,45% das ocorrências nacionais. No entanto, ao relacionar esse valor absoluto à taxa de homicídios por 100 mil habitantes, o Ceará demonstra um crescimento acelerado na última década, superando a média nacional de taxas de homicídio a partir de 2010. Especificamente no contexto cearense, destacam-se os números absolutos de ocorrências de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI), os quais tiveram crescimento de 1.723 casos, o que representa um aumento de 50% em 2017.
Frente ao alto impacto social das taxas de criminalidade, ocorre, por parte do Governo do Estado, um movimento de destinar uma significativa parcela orçamentária para a Segurança Pública. Entretanto, a Rota Estratégica alerta que, com altas taxas de prisões e a superlotação do sistema prisional, torna-se relevante destacar que estudos recentes em países da América Latina demonstram que investimentos em formas alternativas de promoção e manutenção da segurança pública têm-se mostrado mais eficazes. São exemplos disso os investimentos na área de prevenção primária e terciário. A primeira engloba prevenção do risco antecedente ao crime, por exemplo, escolarização; e segunda tem enfoque na ressocialização para prevenir que o egresso reincida criminalmente.
Para o titular da pasta de Segurança Pública do Estado do Ceará, André Costa, o maior desafio é reduzir os índices de violência. Para o secretário, muitos grupos têm utilizado a tecnologia para difundir uma “subcultura do crime”, na qual jovens são cooptados muito cedo para as organizações criminosas.
"Medelin é um exemplo de como os investimentos em segurança pública podem transformar a realidade de um lugar. Não é possível atacar a violência sem atacar aquilo que a gera: a desigualdade social. Combater a violência sem combater a desigualdade é não apenas ineficaz como também imoral." Aníbal Gavíria
Para combater isso, André Costa defende a interação entre diferentes atores e o estímulo a uma mentalidade de planejamento. “A polícia sozinha não vai conseguir superar esse desafio. A segurança é um direito de todo cidadão brasileiro, mas também é responsabilidade. As pessoas podem exigir, criticar e reclamar, mas também podem participar”, afirmou citando os exemplos do Disque Denúncia e do registro de Boletim de Ocorrência. “No país, não temos uma cultura de planejamento. Vamos a cada dia só apagando incêndio. A iniciativa da FIEC é um exemplo da participação da sociedade na segurança pública, em diagnosticar, analisar e propor medidas concretas para que a gente possa avançar”, complementa.
ANÍBAL GAVÍRIA
O lançamento da Rota Estratégica de Segurança Pública contou com a presença do ex-prefeito de Medelin, Aníbal Gavíria, que palestrou com a experiência à frente da cidade colombiana. Gaviria foi prefeito da cidade colombiana de 2012 a 2015, tornando Medelin destaque no cenário mundial, como referência em planejamento urbano. A cidade é um case de sucesso. Na década de 90, era a metrópole mais violenta do mundo. Hoje, é uma das mais inovadoras do planeta e exemplo de como os investimentos em segurança pública podem transformar a realidade de um lugar.
Durante o encontro, o colombiano destacou o papel do Observatório da Indústria, por se tratar de um instrumento que permite a interação entre sociedade e poder público. Para Gavíria, o trabalho realizado na Rota Estratégica de segurança Pública se trata de uma referência importante, uma vez que servirá de direcionamento para a gestão estadual, independente de quem vier a ser o governante.
Ele lembrou que esse tipo de experiência tem sido um modelo exitoso adotado em diversas partes do mundo. “Medelin é um exemplo de como os investimentos em segurança pública podem transformar a realidade de um lugar. Não é possível atacar a violência sem atacar aquilo que a gera: a desigualdade social. Combater a violência sem combater a desigualdade é não apenas ineficaz como também imoral”, alertou.
Fonte: FIEC
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