Eleição deste ano é a mais cara
da história
Levantamento exclusivo da Revista
Congresso em Foco mostra que a previsão de gastos dos candidatos em 2014
ultrapassa R$ 71 bilhões, valor que daria para manter o Bolsa Família por seis
anos e é um terço maior que o previsto na campanha passada
Apesar da maior parte das
contribuições sair do cofre de grandes empresas, eleitor também paga a conta Os
quase 25 mil candidatos que disputam um mandato este ano esperam arrecadar e
gastar, juntos, até R$ 71 bilhões, de acordo com levantamento feito pela
Revista Congresso em Foco no banco de dados do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE). Um terço a mais do que previram os 22 mil concorrentes no começo da
campanha de 2010. Dinheiro suficiente para bancar quase três Copas do Mundo,
considerando-se os valores divulgados em balanço pelo governo federal em maio.
Ou para cobrir todas as despesas com salário e mandato dos 594 deputados e
senadores, inclusive assessores de confiança, por sete décadas. Ou, ainda,
custear por seis anos as 14 milhões de famílias (50 milhões de pessoas) que
sobrevivem com recursos do programa Bolsa Família.
De 2002 a 2010, as despesas
declaradas por candidatos e partidos durante as eleições para cargos federais
cresceram cinco vezes, muito acima da inflação de 76% registrada no período.
Desde as denúncias que derrubaram o então presidente Fernando Collor, em 1992,
o atual sistema de financiamento eleitoral dividiu o noticiário político com o
policial em diversas oportunidades. Foi pano de fundo de todos os mensalões, do
PT, do DEM e do PSDB. Passou a ser visto como uma janela para a corrupção por
autoridades policiais, do Ministério Público e da Justiça. E como uma porta
para a distorção na representação dos políticos, na avaliação de cientistas
políticos e representantes de entidades engajadas na luta pela melhoria da
política no país.
Jogo comprado
“Chegamos ao grau da
insustentabilidade. As eleições são um jogo comprado no Brasil”, afirma o juiz
eleitoral Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa e coordenador
do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
Segundo ele, só se elege quem tem
muito dinheiro ou é apoiado por grandes empresas. “Isso não é legítimo, porque
nega a representação a outros segmentos da sociedade que não o econômico. As
representações estão sob domínio do abuso do poder econômico, que, de ilícito,
tornou-se regra”, acrescenta o magistrado.
Além do aumento de mais de 30% na
estimativa inicial, há outro indicador de que os gastos serão muito superiores
este ano: os presidenciáveis, cujos números finais historicamente se aproximam
do teto previsto inicialmente, praticamente dobraram a estimativa de 2010. Em
busca do posto máximo da República, os 11 candidatos ao Palácio do Planalto
pretendem investir até R$ 917 milhões. Somente os três principais nomes – Dilma
Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB), que substitui Eduardo
Campos (PSB) – projetam arrecadar R$ 738 milhões, ou 80% do total. Há quatro
anos o limite inicial de despesas dos presidenciáveis era de R$ 482 milhões.
Mas, ao final dos dois turnos, as despesas passaram de meio bilhão. No primeiro mês de campanha deste
ano, os candidatos ao Planalto receberam R$ 31,2 milhões, de acordo com a
primeira prestação de contas, divulgada no começo de agosto. Apenas os três
principais concorrentes ficaram com 94% de todo o dinheiro repassado.
Desde 1997, o Congresso Nacional
discute a necessidade de uma lei que limite os gastos das campanhas.
Desinteressados em mudar as regras do jogo do qual se beneficiam, os
parlamentares preferem não colocar o tema em votação e deixar a definição das
despesas máximas com os próprios partidos. Como ninguém quer parar em um teto
baixo de arrecadação, temendo ser ultrapassado pelos adversários, as legendas
costumam exagerar na estimativa. “É uma corrida sem fim, uma bola de neve. Se
um gastar mais, o outro vai tentar superá-lo”, observa o promotor Edson de
Resende Castro, coordenador eleitoral de Minas Gerais.
Nas eleições de 2010, as despesas
declaradas giraram em torno dos R$ 4 bilhões, cerca de 10% dos R$ 48 bilhões
estipulados no começo da campanha. Essa disparidade costuma ser puxada pelos
milhares de candidatos a deputado federal e estadual, que apresentam metas de
arrecadação muitas vezes irreais. Só o PTdoB de Rondônia, por exemplo, estimou
limite de R$ 90 milhões para cada um de seus candidatos à Assembleia
Legislativa. Já o PT de Sergipe fixou o teto de R$ 30 milhões para eleger cada
deputado federal.
Democracia do dinheiro
Gastos mais elevados de campanha
diminuem a competitividade de candidatos com menos recursos, o que dificulta a
representação de setores mais pobres da sociedade e favorece relações
promíscuas entre empresas e candidatos, afirmam os especialistas no assunto.
Para os doadores, as contribuições financeiras são um investimento. Muitos
miram contratos com a administração pública ou benefícios como renúncias
fiscais ou reduções de impostos para suas atividades. Interesses que, muitas
vezes, entram em conflito com o do eleitor que bancou com o voto a eleição de
determinado candidato.
“A avalanche financeira que toma
conta das eleições é o maior fator de distorção da representação política no
Brasil”, diz o líder do governo na Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS),
defensor do financiamento público de campanha e da proibição de doações por
empresas. “O país está se transformando na democracia do dinheiro”, acrescenta.
A mesma crítica é feita pelo
presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Furtado
Coêlho. “Sabemos que a sociedade é desigual, mas temos de construir sistema
eleitoral que iguale os brasileiros, e não os desiguale ainda mais”, defende. A
OAB questiona no Supremo Tribunal Federal (STF) a legalidade do financiamento
eleitoral por empresas. O julgamento foi suspenso em abril, com placar de seis
a um pela derrubada das contribuições das pessoas jurídicas (leia mais na
página 15). Caso os ministros confirmem o posicionamento adotado até agora,
esta poderá ser a última eleição com doação do empresariado.
Via: Congresso em foco
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